BBB: entre a lei e as regras do jogo

Texto publicado originalmente em http://www.adnews.com.br/artigos/bbb-entre-a-lei-e-as-regras-do-jogo


Madrugada de domingo.  No pay-per-view – ou seja, diante dos mais engajados dos espectadores – são transmitidas cenas que podem ser interpretadas como o estupro de uma das participantes de um reality show.  Graças às redes sociais, as reações individuais rapidamente se transformam em tópico de tendência e ganham outras mídias.  E se a opinião pública não chegou a uma conclusão, a controvérsia resvalou em questões muito caras ao espírito de nossa época: direitos da mulher, manipulação da mídia, honestidade.

A mesma Globo que produziu o mais recente ícone de integridade – Griselda, protagonista da novela das nove e, ironicamente, nascida fora do Brasil – estava de uma hora para outra no centro de uma controvérsia sobre transparência e justiça.  Porque se tudo começou como uma indignação contra um comportamento individual, em poucas horas quem estava no "paredão" era a própria emissora. Para as milhares de pessoas que se manifestaram nas redes sociais, seu crime foi ter traído uma relação de confiança.  Afinal, há anos a Globo se empenha em seduzir, em atrair, em engajar os espectadores em torno da franquia BBB,  uma das mais rentáveis de sua programação.  E eis que em um dos momentos mais críticos de questionamento desse mesmo público, a emissora se nega ao diálogo.  Minimiza as críticas.  Demora demais a dar sinais de que ouviu e levará em conta os argumentos dos espectadores.  Aliás, só age após a entrada da polícia no caso que, de tão mal administrado, envolveu até a Secretaria de Política para as Mulheres da Presidência da República.

Mas demorar a assumir que havia um problema foi apenas um dos erros da Globo.  O primeiro de todos – e certamente a matriz de todos os demais - foi subestimar o potencial de crise do Big Brother Brasil.  Ou, pior, de achar que uma crise é uma oportunidade de levantar a audiência.   Como nos ensinam as tragédias gregas, achar que é possível ter controle de tudo é o primeiro tropeço em direção à queda e à desgraça. Dessa postura arrogante, também conhecida como hubris, deriva o fato de que a emissora não tinha um manual que indicasse como proceder caso um dos participantes promovesse algum ato que pudesse ser interpretado como sendo fora da lei.  Entre a regra do jogo e a Constituição, a Vênus Platinada achou que essa "nave louca" estava além da jurisprudência do Estado.  Pois se tal detalhe já tivesse sido considerado, a emissora poderia ter agido proativamente, mostrando o controle que todos os espectadores esperavam.  E não a grande ironia de, em um local recheado de câmeras, ver um suposto crime se desenrolar ao vivo sem qualquer iniciativa de proteção à vítima.

Mas mesmo o suposto crime é resultado de outro risco assumido pela Globo: o consumo de bebida alcoólica.  Não vou entrar aqui no mérito de que a fartura de bebidas nas festas da casa pode ser vista como um incentivo ao consumo de álcool – postura essa em clara contradição com o slogan de Cidadania da emissora.  Como o BBB12 mostrou, pessoas alcoolizadas podem ter iniciativas que, sóbrias, não teriam.

Por isso, a expulsão do Daniel, travestida de ato de justiça, foi, na verdade, uma grande injustiça.  Embora não se possa eximi-lo da responsabilidade individual, há que se levar em conta que todos os participantes são induzidos a bebedeira e, portanto, não estão em plenas condições de decidir por seus atos.  Tampouco foi concedido ao Brother o direito de se defender.  Nem respeitada a premissa legal de que até a condenação, todos são inocentes.

Da estruturação do programa sem um planejamento para gestão de crise à tentativa de abafar o caso empreendida por seu diretor, que negou enquanto pode qualquer perspectiva de apuração do caso, passando pela saída covarde da simples expulsão em lacônicas  e poucas palavras de seu apresentador, a gestão da crise do BBB12 é um case a ser estudado por que trabalha com comunicação corporativa.  Um case do que não se deve fazer em uma crise.

Por Alexandre Rigonato, diretor da AVIV Comunicação